Trecho do livro
“Em primeiro lugar, a atividade militante de Marx não é uma passagem biográfica, mas o complemento necessário da obra, já que tanto uma quanto a outra têm a mesma finalidade: não somente interpretar o mundo, mas transformá-lo e interpretá-lo para transformá-lo. (…) A teoria da revolução comunista é evidentemente o momento em que o caráter crítico-prático da obra de Marx aparece com mais nitidez. No interior dessa estrutura particular, todo elemento teórico pode ter, ao mesmo tempo, uma dimensão prática, cada parágrafo pode se tornar um instrumento de tomada de consciência e organização da ação revolucionária. Por outro lado, a ação prescrita por essa teoria – e praticada por Marx enquanto dirigente comunista – não é voluntarista como a dos socialistas utópicos ou dos blanquistas; ela é uma política realista no sentido lato do termo, ou seja, fundada sobre a estrutura, as contradições e o movimento do próprio real; e por que é realista, supõe uma ciência rigorosa, uma ciência que estabelece, em cada momento histórico, as condições da ação revolucionária. A síntese entre o pensamento e a ‘práxis subversiva’, que existe como tendência em toda a obra de Marx, atinge sua figura concreta na teoria e na prática do ‘comunismo de massas’: a revolução torna-se ‘científica’ e a ciência, ‘revolucionária’.”
Leia a orelha do livro, escrita por Antonio Carlos Mazzeo
Esta edição do clássico ensaio de Michael Löwy sobre o desenvolvimento da teoria da revolução no ideário de Karl Marx chega em boa hora, pois retoma um tema tão estratégico como cutoemancipação proletária. Escrito originalmente em Paris como tese de terceiro ciclo (Doctorat de Troisième Cycle), sob a orientação de Lucien Goldmann, o texto afrontou ps debates nas análises de Louis Althusser, principalmente a polêmica sobre a existência de um “corte epistemológico entre o jovem e o velho Marx.
A importância deste ensaio de Löwy é a de posicionar-se contra a definição althusseriana que esconde o próprio contexto sócio-histórico do desenvolvimento teórico marxiana e reduz suas categorias analíticas ao mero elemento epistemológico. Ignorava-se, então, o que György Lukács definiu como a precoce presença de uma articulação do gnosiológico com um embrionário materialismo dialético nas críticas juvenis de Marx a Hegel, as quais possibilitaram a superação do limitado criticismo à gnosiologia esotérica realizado pela esquerda hegeliana.
Para Löwy, esse ponto estrutural da obra juvenil marxiana não resultou de uma mera crítica especulativa sobre Hegel. Ao contrário, foi a expressão de uma rigorosa práxis teórica, resultante da conexão entre ação política e reflexão sobre a realidade objetiva, que se desenvolveu rente às contradições indissociáveis do processo de concretização do capitalismo e das lutas operárias, principalmente após sua entrada na Rheinishe Zeitung [Gazeta Renana]; como lembra Löwy, Lênin destaca que é esse o momento em que Marx transita definitivamente do idealismo para o materialismo e do democratismo revolucionário para o comunismo.
Mas, para além de pôr no devido lugar histórico-teórico o processo de formação do pensamento de Marx – suas articulações, as rupturas e continuidades das formulações originárias do processo de construção de sua teoria social – este livro nos dá a oportunidade de retomar as atualíssimas questões da relação Estado c sociedade civil burguesa (bürgerlich Gesellschaft), di citoyen de vida pública e do bourgeois ou proletáire de vida privada, assim como dos limites da democracia burguesa, temas tratados com profundidade radical pelo jovem Marx e definidos por Friedrich Engels como o “reino idealizado da burguesia”.
– Antonio Carlos Mazzeo
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