A liberdade liberal burguesa também é falsa, e assim como a ilusão de liberdade pelo consumo, faz nos crer que somos livres ao exercermos a chamada cidadania. Nessa lógica, a sociedade seria uma “máquina” cujas engrenagens precisam funcionar bem e ajustadas para o bom andamento da vida. O estado, as suas instituições e seus “especialistas” trabalhando em prol do social, cabendo ao povo apenas trabalhar e saber quando e onde deve opinar, e querem nos fazer crer que é liberdade o direito de aceitar toda essa degeneração. Ser livre é ter o direito de ser uma peça útil para o capital, deixando que a moral, a economia e a justiça sejam regulamentadas pelo estado. Só existimos enquanto cidadãos, produzindo, consumindo e prestando obediência às leis do estado.
“(...)A liberdade política significa que a “polis”, o Estado são livres; a liberdade religiosa, que a religião é livre; a liberdade de consciência, que a consciência é livre e não que eu seja livre do Estado, da religião e da consciência, ou que eu tenha me livrado disso tudo. Não se trata de minha liberdade, mas daquela de uma potência que me domina e me subjuga: um de meus tiranos – o Estado, a religião, a consciência – é livre, um desses tiranos que fazem de mim seu escravo, de tal modo que sua liberdade é minha escravidão.” (Stirner, Max Stirner e o Anarco Individualismo, pg50)
No liberalismo não há o rei ou senhor feudal, então há liberdade? Substituiu-se uma escravidão por outra, a de classe, a escravidão do capital sob as leis e a moral do estado. A liberdade aqui é “limitada pela do outro”, é como uma mercadoria, uma propriedade privada. O estado tem a liberdade de julgar, determinar, e possuir, afastando as decisões da responsabilidade das pessoas, que agora são apenas cidadãos e devem desempenhar seu papel como cidadãos, papel esse em que não cabe a decisão sobre seus destinos.
“Responder-se-á que o Estado, representante da salvação pública ou do interesse comum, só suprime uma parte da liberdade de cada um, para lhe assegurar tudo o resto. Mas este resto, é a segurança, se quiserem, mas nunca será a liberdade. A liberdade é indivisível: não se lhe pode suprimir uma parte sem a destruir por inteiro. Esta pequena parte que suprimem, é a própria essência da minha liberdade, é o todo. Por um motivo natural, necessário e irresistível, toda a minha liberdade se concentra precisamente nessa parte, por pequena que seja, que suprimem.” (Bakunin, Conceito de Liberdade, pg.26)
Na democracia liberal burguesa, baseada na exploração e no lucro, a chamada “limitação da liberdade” é a ausência da mesma. Nascemos nesse sistema, não foi uma escolha, e aquele que o renuncia sofre todos os métodos de repressão, difamação e marginalização pelo estado para que não se torne um exemplo, já que seria muito perigoso para aquele que quer impor uma estrutura e um sistema sobre a sociedade haver elementos contestatórios dos mesmos.
A liberdade segundo o Anarquismo
A liberdade que busca o anarquismo vai de encontro a todas essas alienações e mentiras criadas, impostas, e reproduzidas pelo interesse privado burguês. Vai, mais além, contra toda forma de relação alienada e de domínio entre os seres humanos e contra as criaturas desse planeta, visto que o domínio pode dar-se fora do econômico.
Longe de ser limitante, a liberdade é a condição principal para o desenvolvimento das potencialidades individuais e humanas, o contrário das “castrações” que o sistema nos sujeita, onde temos que nos moldar e deformar dentro de modelos econômicos baseados em princípios discriminatórios, de lucro e ganância. Contra a “liberdade” suicida liberal e de consumo, em que todos na sociedade somos inimigos e competidores em busca de efemeridades materiais, a liberdade Anarquista tem claro que “o homem só se torna homem e só chega à consciência e à realização de sua humanidade em sociedade e somente através da ação coletiva da sociedade inteira.” (Bakunin, textos Anarquistas, pg.46). E que “a liberdade não é, pois, um fato de isolamento, mas de reflexão mútua, não de exclusão, mas de ligação; a liberdade de todo indivíduo é entendida apenas como a reflexão sobre sua humanidade ou sobre seu direito humano na consciência de todos os homens livres, seus irmãos, seus semelhantes.”(idem, pg.47). Disso resulta que não se pode ser livre em uma sociedade de escravos, ser cidadão ou consumista não é ser livre visto que tais condições pressupõe um regime de exploração e desigualdade, e se há desigualdade, há dominação e conseqüentemente supressão da vontade. Aquele que nasce em uma sociedade desigual, vai ser educado para reproduzir e desigualdade e não a liberdade.
O estado diz que somos todos iguais, vivendo numa democracia, mas “diante do soberano supremo, o único digno de comandar, nós todos nos tínhamos tornado iguais, pessoas iguais, isto é, zero. Diante do proprietário supremo, tornamo-nos todos mendigos iguais.” (Stirner, O Anarquismo Individualista, pg.22) Porque “é nisso que consiste o tipo de educação e de cultura que pode me dar o Estado: ele faz de mim um instrumento utilizável, um membro útil da sociedade.” (idem). Conformar-se com o caos social e achar que teremos voz através dos meios ditos “legais” e “democráticos” do estado é a ilusão que o mesmo nos faz acreditar. Ser livre é ter igualdade de voz, ser reconhecido como alguém que tem opiniões e deve participar das decisões que vão interferir em sua vida e em
seu meio, garantindo-lhe o que é necessário à vida, sem intermediações ou burocratismos, que têm por objetivo não representar, mas isolar, afastar o povo do poder. Acreditamos na “impossibilidade da liberdade política sem igualdade política. Impossibilidade desta, sem igualdade econômica e social.” (Bakunin, Textos Anarquistas, pg.68).
Lutamos para ouvir e sermos ouvidos, para decidir e ter responsabilidade sobre o que decidimos, para criar e viver seguindo princípios por nós estipulados coletivamente, sem imposição ou dominação sobre outro, sempre conscientes daquilo que fazemos e seus resultados sobre a sociedade. Sem dogmas, leis ou julgamentos baseados em uma moral elitista e mistificada.
“A liberdade é o direito absoluto de todo homem ou mulher maiores de só procurar na própria consciência e na própria razão as sanções para seus atos, de determiná-los apenas por sua própria vontade e de, em conseqüência, serem responsáveis primeiramente perante si mesmos, depois, perante a sociedade da qual fazem parte, com a condição de que consintam livremente dela fazerem parte.” (idem, pg.74).
Enfim, a liberdade pela qual luta o Anarquismo é a revolução, é a ruptura total com tudo aquilo que tem dominado e drenado nossas vidas e que hoje se entende por capitalismo.
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